domingo, 19 de dezembro de 2010

Mal nos conhecemos 
Inauguramos a palavra amigo! 
Amigo é um sorriso 
De boca em boca,
Um olhar bem limpo 
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece.
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
Amigo (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
Amigo é o contrário de inimigo!
Amigo é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado.
É a verdade partilhada, praticada.
Amigo é a solidão derrotada!
Amigo é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
Amigo vai ser, é já uma grande festa!

Alexandre O'Neill

terça-feira, 14 de dezembro de 2010


".
Oh, não me eleves!
Quem sabe se me ergo.
Levanta apenas ao de leve o rosto
Para que, chovendo eu,
Quase te pareçam ser lágrimas tuas.

Se te assolar a minha rempestade,
coloca-te, direita, frente ao meu vento;
fecha as pálpebras ao meu sopro,
fica cega
desse simples ver-me.

R. M. Rilke"
.
Oh, não me eleves!
Quem sabe se me ergo.
Levanta apenas ao de leve o rosto
Para que, chovendo eu,
Quase te pareçam ser lágrimas tuas.

Se te assolar a minha rempestade,
coloca-te, direita, frente ao meu vento;
fecha as pálpebras ao meu sopro,
fica cega
desse simples ver-me.

R. M. Rilke

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010


".
BOM DIA...a todos debaixo do Sol....
....Observemos a natureza à nossa volta. Toda a criatura viva, todo o planeta vai buscar a sua vida ao Sol. Toda a criatura é um milagre. Procuremos a calma para as nossas tempestades existenciais. È dentro de nós que se situa o lugar do maior amor. Se o vento nos levar o guarda-chuva lembremo-nos que o Sol há-de chegar."
.
BOM DIA...a todos debaixo do Sol....
....Observemos a natureza à nossa volta. Toda a criatura viva, todo o planeta vai buscar a sua vida ao Sol. Toda a criatura é um milagre. Procuremos a calma para as nossas tempestades existenciais. È dentro de nós que se situa o lugar do maior amor. Se o vento nos levar o guarda-chuva lembremo-nos que o Sol há-de chegar.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Suportas e separas
os mistérios de Ísis,
conténs mundos
entre as coxas quentes
enquanto esperas
a minha estrela funda
dentro do teu silêncio.

Tens dois versos
ondulados no peito,
uma filosofia púbica
onde tudo é gerado
onde tudo é todo um céu
de noites antiquissimas.

Nessa visão perturbadora
deixas-me na exacta distância
onde todas as vontades
vão dar ao teu íntimo suspiro,
ao que resta de mim
e ao amor que é tudo
o que ainda seremos.


ajc

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Poema de me chamar António

Hoje, ao nascer do sol, de manhãzinha, 
ouvi cantar um galo no quintal 
quando eu tinha seis anos e fui passar as férias do Natal 
com a minha madrinha. 
Na cama improvisada no corredor
sabiamente fingia que dormia
muito embrulhado num cobertor,
enquanto numa luz melada e quase fria,
o mundo, sabiamente,
fingia que nascia.
E então apeteceu-me também nascer,
nascer por mim, por minha expressa vontade,
sem pai nem mãe,
sem preparação de amor,
sem beijos nem carícias de ninguém,
só, só e só por minha livre vontade.

Dobrado em círculo no ventre do meu cobertor,
enrugado como um feto à espera da liberdade
(viva a liberdade!)
cerrava e descerrava as pálpebras, sabiamente,
como se as não movesse,
como se não sentisse nem soubesse,
abrindo-as numa fenda dissimulada e estreita,
insensível às coisas quotidianas,
mas hábil para aquela alvorada puríssima e escorreita
que me inundava o sangue através das pestanas.
Fremiam-se-me as pálpebras sacudindo na luz um pó de borboletas,
um explodir de missangas furta-cores,
bacilos e vapores,
rendas brancas e pretas.

Cada vez mais feto, mais redondo, mais bicho-de-conta,
mais balão, mais planeta, bola pronta
a meter-se no forno,
mais eterno retorno,
mais sem fim nem princípio, sem ponta nem aresta,
excremento de escaravelho aberto numa fresta.

Foi então que o tal galo cantou.
Looooooonge...
Muito looooooonge...
no quintal da vizinha,
lá para o fim do mundo mesmo ao lado da casa da minha madrinha.
Era uma voz redonda, débil, inexperiente,
bruxuleante como a chama
que está mesmo a apagar-se e esperta de repente
e novamente morre e de novo se inflama.
Uma voz sub-reptícia, anódina, irresponsável,
fugaz e insinuante,
um canto sem contornos, aéreo, imponderável.
Tudo isso e muito mais, mas principalmente distante.

Foi assim que a voz do galo na capoeira
do quintal da vizinha
que tinha plantado ao centro uma nespereira
mesmo junto da casa da minha madrinha,
penetrou no ventre macio do meu cobertor.
Era uma frente de onda, compacta e envolvente,
pura já na garganta e agora mais que pura,
filtrada
e destilada
nos poros ávidos da minha cobertura.
Chegou e fulminou o meu ser indigente,
exposto e carecido,
naquele gesto mole e distraído
do Deus omnipotente
da Capela Sistina
quando ergue a mão terrível e fulmina
o coração
de Adão.

E pronto. Eis-me nascido. Cheio de sede e fome.

António é o meu nome."



António Gedeão, in Linhas de Fogo