segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

 A Velhice de Prometeu

Escreve as suas memórias. Tenta definir o lugar dos heróis no sistema da necessidade, de conciliar as noções contraditórias da existência e do destino.

As chamas crepitam alegremente na lareira, a sua mulher agita--se na cozinha — exaltada, incapaz de lhe dar um herdeiro, mas que se consola com a ideia de que mesmo assim terá o seu lugar na história. Está ocupada a preparar uma ceia para o cura da esquina e o farmacêutico, actualmente o amigo mais íntimo de Prometeu.

As chamas crepitam na lareira. Na parede estão penduradas uma águia empalhada e uma carta de agradecimento assinada por um tirano caucasiano que graças à descoberta de Prometeu pôde reduzir a cinzas uma cidade revoltada.

Prometeu ri para si próprio. Não tem outro meio para exprimir o seu desacordo com o mundo.

Zbigniew Herbert (1924-1998)
Escolhido Pelas Estrelas — antologia poética
(apresentação e versões de Jorge Sousa Braga)

Sem comentários:

Enviar um comentário