A Velhice de Prometeu
Escreve as suas memórias. Tenta definir o lugar dos heróis no sistema
da necessidade, de conciliar as noções contraditórias da existência e
do destino.
As chamas crepitam alegremente na lareira, a sua
mulher agita--se na cozinha — exaltada, incapaz de lhe dar um herdeiro,
mas que se consola com a ideia de que mesmo assim terá o seu lugar na
história. Está ocupada a preparar uma ceia para o cura da esquina e o
farmacêutico, actualmente o amigo mais íntimo de Prometeu.
As
chamas crepitam na lareira. Na parede estão penduradas uma águia
empalhada e uma carta de agradecimento assinada por um tirano caucasiano
que graças à descoberta de Prometeu pôde reduzir a cinzas uma cidade
revoltada.
Prometeu ri para si próprio. Não tem outro meio para exprimir o seu desacordo com o mundo.
Zbigniew Herbert (1924-1998)
Escolhido Pelas Estrelas — antologia poética
(apresentação e versões de Jorge Sousa Braga)
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