quinta-feira, 22 de junho de 2017




As marés em redor da tua ilha;
o pequeno arquipélago na paz
da solidão marinha; a maravilha
do jeito da onda eu o teu corpo faz.

Sobre o pálido estuque da parede,
como um espelho da minha própria imagem,
uma seara de Van Gogh morre à sede
no óleo espesso e fulvo da estiagem.

Ao calor do céu de tela passa,
arrancando pedaços de céu velho,
um bando de aves que pressente a ameaça
no horizonte de cor, raso vermelho.

E de repente dou comigo absorto,
as mãos entre papéis de antigos versos,
soprando um lume que supunha morto
e aquece ainda os dias já submersos.

Ó mãos inquietas, porque não parais?
Mais do que penso, sonho: donde vim?
e as pupilas do tempo, azuis, mortais,
acordam a chorar dentro de mim.




carlos de oliveira
a noite inquieta
antologia poética
quasi
2001


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