sábado, 26 de março de 2016

Lisboa Rua do Sol ao Rato
chuva

correndo na direcção do Largo
quase derrubei um velho de sobretudo
que acenava de bengala
gesto ancho
para a graça de um prédio devoluto

admirei a pintura desse
obstáculo posto entre a passagem dos elefantes
Ganecha montado num
Roedor

Mário Cesariny era Surya sob influência
de um Ganges atmosférico
ainda raspei no acontecimento ainda
olhei para trás

e quando de novo me virei
já havia
entrado num veículo desaparecido num aceno
de múltiplos braços

o Sol terá despontado por cima
o rato iluminou

mudou para tarô num anagrama fácil

o bardo
finou subiu tornou enfim ourives
como quisera o pai
porém de um metal distinto agora
corpo invisível

óleo sobre cartão

queremos vê-lo hoje entre uma horda
de anjos marujos
que jamais o deixarão ir sozinho para
casa

amando-o à varanda do tempo como
na praia nortenha da infância
enxame de pirilampos dispersos sobre a água
de um poço escuro

como se de novo a irmã pousasse
sobre a mesa o bule tornasse à cozinha
raspando as pantufas

e de roupão voltasse Mário
da janela
vertesse os dedos extraordinariamente
sobre o marfim pálido

e tocasse



miguel-manso
da cegueira dos pintores
persianas
tinta da china
2015

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