terça-feira, 15 de março de 2016

Bichos-de-Conta

A lenha estava húmida. Saltaram
dois bichos-de-conta, atordoados pelo fogo,
quando a lareira pegou. Acaçaparam-

-se, como faziam, quando o meu filho
os guardava em caixas de fósforos, novelos
surpreendidos na azáfama das suas tardes.

Que sentiriam os bichos-de-conta?
Enrolados, esperariam iludir a fogueira
ou esquecer a clausura?

Ainda se fossem formigas, assediadas
pelo dever, com o tempo escandido
em prazos e filas, ou salamandras,

que vivem húmidas e se nutrem do fogo,
ou animais clandestinos como a barata,
mas um bicho que se reduz ao mínimo

desconhece o mundo e a morte assusta-o.

José Alberto Oliveira (1952)
Tentativa e Erro — poemas escolhidos e inédito

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