sexta-feira, 1 de abril de 2016

[Outra estação:]

Outra estação: 
mas não o ciclo 
em que o sol se amedronta ou reanima, 

os jardins se reduzem 
a um corpo transido, 
ou estuantes projectam seu domínio 
em laivos e oloroso alento,
 
os frutos se completam a acender 
o gosto e as mãos que os solicitam, 
ou se decompõem na lembrança 
da imagem que nos gasta ao esvair-se.

É o curso exausto pelo entorpecer 
do ímpeto do sangue,
 
com a voz despojada da harmonia 
que dá sua força aos nomes,
e lábios que ao buscarem rostos densos 
aspiram cinzas, sombras: 

cerram-se os olhos, até se consumar 
a hora lenta que os rende 
pela estrela da tarde.

José Bento (1932)
Alguns Motetos

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